Confessionário

Junto as mãos, fecho os olhos, abro os lábios da alma…

Vou lhe contar um segredo, só não sei se pedirei perdão. Guardei-me apertada em cintas, amarrada em cordas, trancada em gestos medidos, pequenos, contidos pra me conter. Mas ainda estou aqui, nunca sequer me retirei.

Tenho uma fome e um medo que me atordoam e tenho olhos debaixo dos olhos que rezo pra não os verem, rezo pra não os lerem. São feitos de palavras ensinadas pra se calar. E eu calo, disciplinadamente amordaço os meus olhos e lhes calo. Mas por dentro eu não me calo… Fico engolindo eu mesma, pra que eu não me saia. E me devoro e me acabo e torno a surgir. E mais uma vez me devoro, mais uma vez me acabo. Mas eu não me acabo…

Não lhe peço perdão; apenas lhe confesso eu. Tenho eu dentro de mim e eu não me caibo. Mas eu minto que sim, desenho flores, distraio minha fúria, distraio meus desejos, distraio minha entrega, distraio-me tanto até me distrair de mim. E então distraída, enganada, guardo-me apertada em cintas, amarrada em cordas, trancada. Mas continuo aqui, nunca sequer me retire. Algoz de mim. Uma piedosa algoz.

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